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terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Pense no Haiti

É claro que, se por um lado, há muita gente preocupada e envolvida com a ajuda humanitária ao Haiti após a tragédia mais recente entre as diversas e históricas que o país vem sofrendo, por outro, sempre há quem lembre das mazelas nacionais e regionais, que também não são poucas, é verdade. Mas há ainda o aspecto político que ambas as visões acabam suscitando, e o aproveitamento do momento de forma bastante mesquinha, pois não é uma real preocupação com o local (nesses casos de aproveitamento). Achei muito
interessante e reproduzo o artigo veiculado hoje em Zero Hora.

"19 de janeiro de 2010 | N° 16220
ARTIGOS
A necessária solidariedade, por André Luiz Reis da Silva*
Como sabemos, uma tragédia se abateu sobre o Haiti. Além das décadas
de ditadura e de conflitos, teve de enfrentar um rigoroso terremoto,
que vitimou dezenas de milhares de pessoas e arruinou o país. Uma
tragédia que, sem uma ação rápida e forte, tem todos os ingredientes
para se transformar em uma catástrofe humana.
O Brasil, já engajado no processo de paz no Haiti, respondeu
imediatamente com envio de ajuda humanitária e será um dos líderes do
processo de reconstrução do país. Entretanto, o que é uma mostra da
vitalidade e solidariedade do governo e do povo brasileiros tem
ensejado leituras distorcidas a respeito da ajuda internacional.
Infelizmente, setores da imprensa ensaiaram um argumento acerca das
respostas dadas pelo governo federal às tragédias que se abateram em
vários pontos do Brasil em razão das enchentes provocadas pelas
chuvas. Sobretudo os representantes da imprensa gaúcha em Brasília
costumam utilizar signos e códigos farroupilhas que ainda estão
flutuando no imaginário regional acerca das relações com o governo
federal. Tal como no Império, estamos a pedir mais recursos, que não
vêm na contrapartida do nosso trabalho e contribuição da nação. Assim,
os nossos flagelados teriam sua ajuda desviada para um país distante.
Entretanto, o argumento de que a ajuda internacional desvia
necessários recursos internos de um país pobre é descabido. O Brasil
não é um país pobre. O problema é a injustiça social e a desigualdade
de renda, que se reflete na nossa cultura, nas nossas instituições e
na nossa formação econômica.
O Brasil vem crescendo diplomaticamente nos últimos anos, e o país
está se constituindo um interlocutor cada vez mais requisitado nos
fóruns internacionais. A ajuda brasileira é condizente com o papel que
o Brasil vem tendo no sistema internacional. Todos os países que têm
essa força e influência devem contribuir para a paz, a segurança, a
estabilidade e o desenvolvimento, tanto do ponto de vista político
quanto econômico e, inclusive, militar. O Brasil tem uma
responsabilidade maior que outros países sobre o Haiti, pois é o
responsável pelas tropas que procuram construir a paz num país
devastado pelos conflitos. Tem feito isso com dificuldades, mas foi,
depois de diversas experiências, a missão da ONU mais bem-sucedida no
Haiti.
Há um grande risco de que a frágil estabilidade alcançada no Haiti se
desestruture rapidamente, o que exigiria do Brasil e outros países um
rápido aumento da ajuda e de contingentes militares. Os próprios
militares que já atuam no Haiti ficariam em uma situação de
vulnerabilidade, devido à instabilidade social e ao desvio de suas
funções originais.
Assim, a política externa brasileira está em consonância com o poder e
a representatividade do Brasil no sistema internacional. E a isso
devemos nos acostumar, depois de tanto tempo com uma baixa autoestima
nacional. Cada vez mais a bandeira e a solidariedade do Brasil estarão
presentes em lugares distantes geograficamente, mas muito próximos de
nós nos sonhos e nas vicissitudes. Enfim, a mesquinharia comparativa
não condiz nem com o próprio imaginário farroupilha, adepto do
espírito solidário.

*PROFESSOR DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA UFRGS"

Aliás este é o outro artigo que o jornal traz hoje (Eduardo Lima Silva, jornalista e perito criminalístico) tão pertinente quanto, afinal, fala de impunidade e corrupção, de cultura e educação, ou seja, dos verdadeiros inimigos da falta e desvio de recursos. Infelizmente não partilho do mesmo otimismo com relação a outubro, nem sempre pelos resultados, até, mas pelas razões... mas isso é mais complexo e para outro momento.

Trilha sonora: http://twitter.com/leticiacastro79/status/7746647249



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