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sexta-feira, 19 de junho de 2009

Por que o diploma

Jayme Copstein conforme ele próprio, "nasceu jornalista". E é exatamente por isso que o texto dispobinilizado abaixo e o que colocarei no próximo post, demonstram, inclusive com os comentários de pessoas que responderam ao seu artigo, o que realmente significa a decisão do STF - embora o texto a seguir tenha sido escrito antes dela.

Por que o diploma

* Jayme Copstein

A ação no STF, extinguindo a exigência do diploma universitário para o exercício profissional do Jornalismo representa vários passos para trás. A única hipótese de prosperar a tese, de que viola os artigos 5º (liberdade de expressão) e 220 (liberdade de informação jornalística) da Constituição Federal, é incluir também a inconstucionalidade da exigência de diploma específico para o exercício da medicina, da odontologia, do direito, de qualquer profissão universitária. Ou seja, voltar a 1911, como pretendeu o gaúcho Rivadávia Corrêa, então ministro do Interior e Justiça do governo Hermes da Fonseca, em sua reforma do ensino: “A instrução superior e a fundamental, difundida pelos institutos criados pela União, não gozarão de privilégio de qualquer espécie”.

Ao pé da letra, teríamos também de extinguir todos os tribunais, da 1ª instância ao próprio STF: exigir diploma de direito e concurso para magistratura cerceia nosso direito de pensar, exprimir e informar o que pensamos das leis e das sentenças dos juízes, fazendo nossas próprias leis e aplicando nossas próprias sentenças.

Aí reside o equívoco de quem deseja revogar a regulamentação do Jornalismo. Ela não proíbe que alguém pense o que bem lhe aprouver a respeito de tudo e que manifeste livremente seus pontos de vista, através dos jornais, das emissoras de rádio e tevê e da Internet. Todos os veículos reservam espaços generosos para colaboradores, convidados ou não, aos quais basta enviar a matéria em originais legíveis, respeitadas as normas de linguagem e a limitação do espaço. Da mesma maneira, a interação, através das cartas de leitor, do e-mail dos internautas ou telefonemas de ouvintes e telespectadores são parte importante das atividades do Jornalismo de hoje. Há até quem, antes de estabelecer a pauta para a cobertura ou o debate, submeta a questão ao público.

O que a regulamentação do Jornalismo exige - tal como a da medicina, da odontologia, do direito, enfim de todas as carreiras universitárias - é que, como profissão universitária que realmente é, seja exercida mediante a habilitação específica em curso superior.

Antes e depois
Permitam-me argumentar com depoimento de natureza pessoal: nasci jornalista. Jamais na minha vida quis ser outra coisa. Apaixonei-me pela profissão, sem saber que era profissão, em 1936, quando tinha oito anos de idade, e ouvi meu tio Maurício, ler em voz alta para a família a notícia, publicada por “A Razão”, de Santa Maria, de que Mussolini havia invadido a Abissínia.

Daquele momento em diante, ao escrever trabalhos escolares, procurava reproduzir o estilo sucinto e direto daquela notícia, o que me trouxe notoriedade como “redator” no Colégio Lemos Júnior, de Rio Grande. Aos 15 anos de idade, quando comecei a carreira profissional, entrei em conflito com meu pai. A última coisa que permitiria a um filho seria a profissão de jornalista, na qual superabundavam “bêbados, caloteiros e cafajestes que não davam para mais nada".

Isso foi em 1943, antes da criação dos cursos de comunicação social e da primeira regulamentação, a de 1967, de cuja luta Lucídio Castelo Branco, então presidente do Sindicato da categoria no Rio Grande do Sul teve desempenho decisivo. Foi o que trouxe dignidade à nossa profissão. Não temos nem como nem porque renunciar a ela. Tenho certeza de que meu pai, hoje, estaria orgulhoso do trabalho do seu filho e também da sua bisneta, Joyce, aluna da PUC, já cumprindo estágio na Rádio Gaúcha.

Ele reservaria seus adjetivos depreciativos a quem quisesse derrubar a regulamentação profissional. (...)

Ainda o diploma
A regulamentação do exercício profissional do Jornalismo, levantado ontem nesta coluna, despertou o debate entre os leitores de O Sul e também entre os usuários de www.jaymecopstein.com.br (seção “Fórum”), onde as opiniões igualmente são transcritas. A discussão do tema permanece aberta.

Fábio Costa (Porto Alegre) tece estas considerações:
“Em seu artigo em O Sul, intitulado "Porque o diploma", notei um conflito de idéia. Ao mesmo tempo que defende a exigência do diploma universitário para o exercício profissional de Jornalismo, diz ter nascido jornalista. É nesse ponto que gostaria da reflexão do amigo, se assim me permite chamá-lo. Acredito que exista uma confusão generalizada quanto a essa questão. Paixões estão falando mais alto do que a razão. Na minha opinião, não há qualquer problema em exigir o diploma de jornalista. O que não se pode é proibir profissionais competentes na área, mesmo sem diploma, exercerem a profissão. Trabalho numa mídia forte (Emissoras de Rádio, TV, Revista e internet) e não possuo o referido diploma. Oriento jovens recém saídos das faculdades e que não sabem escrever uma linha, mas que possuem o referido documento. O prezado amigo nasceu jornalista, pois escrever é dom. Seu cabedal de cultura me exime de relatar vários grandes jornalistas que não passaram pelos bancos escolares. O senhor há de concordar comigo que o ensino hoje oferecido nas Universidades está longe de formar bons profissionais. O senhor vem do tempo que não se exigia o diploma, mas seu talento, competência o fez um grande e respeitado jornalista. Seu caso, assim como de tantos outros, deveria ser bandeira para se encontrar um meio termo nessa questão. Continuaríamos a exigir o diploma, mas, em contrapartida, buscaríamos mecanismos de averiguação que atestassem a competência de jornalistas sem o referido diploma. Fico a imaginar seu talento de jornalista reprimido, caso tivesse começado a escrever depois de 1967. Abraço, Fábio Costa.”

Comentário: Descontada a generosidade das palavras a respeito do colunista, o Fábio Costa tem razão no que argúi: a inexistente seleção de talentos e a deficiente formação dos profissionais da área. O problema, contudo, não é só dos cursos de comunicação social. É de todo o nosso ensino. Deveria ser a prioridade no debate da política educacional, mera ficção no Brasil de hoje, sem a qual não se constrói um país e cujos resultados não se colhem antes de duas ou três décadas. Não é, porém, o que está em julgamento no STF. Lá o que foi pedido é a pura e simples extinção da regulamentação do exercício profissional do Jornalismo. A pergunta que se impõe é: por que só o Jornalismo? É uma profissão inferior à medicina, à engenharia, à odontologia, ao direito?

Nem como anedota, tem graça.

James Masi, de Porto Alegre, argumenta:
“Você sabia que para fazer programas de computador, websites, etc. não é necessário diploma de Bacharel em Informática? Acredito que é uma profissão bastante técnica, tanto quanto é o Jornalismo, você não acha? Entretanto, estamos aí, com a Internet "bombando" em todo Brasil e muita, mas muita gente mesmo que trabalha na área jamais pisou na Universidade, quanto mais num curso de Informática ou Ciência da Computação. Se eu sou a favor de que seja exigido diploma? Não! Sobrevive na área quem é bom, independentemente de diploma. Acho que no Jornalismo também isso é possível. Já em Medicina, um erro técnico pode levar à morte. Não é a mesma coisa. Tanto em Jornalismo como Informática, o erro sempre pode ser detectado previamente sem seqüelas, e isso é que as torna diferente da Medicina ou Engenharia Civil, por exemplo.”

Comentário: Obrigado ao James Masi pela participação. Apenas contraponho que não se exige diploma universitário de quem deseje fazer um jornal, e há tantos jornais de bairro, de agremiações comunitárias, e também emissoras comunitárias quanto há páginas na Internet. Talvez haja menos por questão de custos e complicações tecnológicas. Em compensação, duvido que alguém possa ser analista de sistemas sem formação universitária. Apenas alerto ao James Masi que erros na informática ou no Jornalismo também podem conduzir a tragédias, tal qual a Medicina. Já vi gente induzida ao suicídio por notícia de jornal. Deve haver exemplos similares em sua área. (...)

* Colunista do jornal O Sul, do RS. As colunas foram publicadas nos dias 29 e 30 de setembro. - E reproduzidas no site da Fenaj em http://www.fenaj.org.br/materia.php?id=2307 a 06 de outubro de 2008.

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